Carta do Gestor
Entre fluxos e fundamentos: a escolha de quem olha para cima

Não olhe para cima!
“O maior risco nos investimentos é a possibilidade de estar errado junto com a maioria.”
Howard Marks
No filme “Não Olhe para Cima” disponível na plataforma do Netflix, Randall Mindy e Kate Dibiasky, interpretados por Leonardo diCaprio e Jennifer Lawrence, identificam um cometa em rota de colisão com a Terra. Apesar das provas científicas irrefutáveis, as pessoas se negam a aceitar a realidade, fragmentando-se em discursos convenientes, polarizações ideológicas e campanhas de desinformação. A distância entre os fatos e a percepção coletiva cresce rapidamente, e quando a verdade se torna inescapável, já é tarde demais. A tragédia se consuma não apenas pela força dos eventos naturais, mas pela incapacidade humana de agir diante de evidências incômodas.
A facilidade com que o ser humano adota novas narrativas, muitas vezes em detrimento de uma avaliação crítica do que realmente importa, é um traço recorrente tanto na ficção quanto na história dos mercados.
Na Grande Recessão de 2008, sinais evidentes de excessos no mercado de crédito foram ignorados ou minimizados por boa parte dos agentes econômicos, alimentando uma sensação artificial de estabilidade que, no fim, revelou-se insustentável. Hoje, embora sob uma roupagem distinta, observamos ecos desse comportamento: investidores globais, ansiosos por retornos, mostram-se dispostos a aceitar riscos crescentes em mercados periféricos, muitas vezes subestimando a deterioração das bases fundamentais. A memória curta do mercado, como no filme, torna a percepção coletiva vulnerável a narrativas que privilegiam o imediato em detrimento da avaliação crítica dos riscos.
Uma dinâmica semelhante pode ser observada atualmente nos mercados financeiros. Desde o Liberation Day de Donald Trump, a narrativa dominante construída é a de que as ações americanas ficarão à deriva nos próximos meses (quiçá anos). Essa visão, alimentada pela expectativa de desaceleração econômica momentânea nos Estados Unidos e por movimentos expressivos de fluxos de capitais para Europa, Ásia e mercados emergentes, ganhou força e influenciou decisões de realocação em larga escala.
Ainda assim, como Randall Mindy, que mesmo conhecendo a gravidade da situação é momentaneamente atraído pela validação pública, também sentimos a tensão entre agir taticamente e manter a convicção sobre os fundamentos. De forma ativa, capturamos parte desse movimento, ajustando o curso de alguns portfólios para beneficiar-se da dispersão de recursos — a posição long ouro e short DXY deu frutos ao portfólio global. Mas reconhecemos que, embora os fluxos de capitais sejam relevantes no curto prazo, eles não alteram a força intrínseca das empresas americanas, cuja história de resiliência e capacidade de reinvenção é incontestável.
Diante da facilidade com que os investidores se esqueceram dos pilares de resiliência americana, vale recordar uma advertência do sábio Warren Buffett que atravessou gerações de investidores: “Don’t bet against America.”
Ao longo de sucessivas crises — sejam elas econômicas ou políticas — as companhias americanas demonstraram uma capacidade singular de adaptação, inovação e superação. Essa resiliência estrutural, capaz de transcender os ciclos, é frequentemente subestimada nos momentos em que narrativas alternativas parecem mais sedutoras. Apostar contra essa força histórica, portanto, é praticamente cair na armadilha da afirmação “dessa vez é diferente”.
Portanto, mesmo reconhecendo a validade de movimentos táticos em outros mercados, mantemos a convicção estrutural na liderança das corporações americanas. Respeitar os ciclos e compreender os sinais conjunturais é essencial, mas a disciplina analítica e a capacidade de resistir à sedução das narrativas simplistas são os fatores fundamentais que definem uma gestão consistente.
Na nossa leitura, as distorções atuais criam sim oportunidades nos mercados emergentes, mas também — e principalmente —, em ativos de alta qualidade nos Estados Unidos, penalizados por uma percepção de risco que julgamos, de certa forma, alarmista. O verdadeiro desafio, como mostra “Não Olhe para Cima”, é manter o olhar crítico e independente quando a maioria prefere seguir o conforto da opinião coletiva (e passageira, afinal de contas, como referendado anteriormente por outros episódios, o capital não aceita desaforo…).
Com essa perspectiva em mente — atentos aos movimentos táticos, mas ainda ancorados no empirismo —, avançamos agora para uma análise mais objetiva do cenário macroeconômico global, contrastando as dinâmicas que hoje sustentam a nova narrativa pró-Europa frente à solidez histórica da economia americana.
Entre as narrativas e a realidades: Estados Unidos x Europa
A construção de cenários robustos exige mais do que a leitura atenta dos fluxos de capitais — exige a avaliação crítica dos fundamentos que sustentam cada economia. Embora o recente redirecionamento de recursos em direção à Europa tenha reforçado a percepção de que os Estados Unidos ficarão para trás, uma análise mais sóbria revela que a realidade é, como quase sempre, mais complexa do que a narrativa dominante sugere.
A seguir, contrastamos os dados de investimento público, atividade econômica (PMIs), mercado de trabalho e endividamento público entre as duas regiões, buscando responder a uma pergunta central: o deslocamento de fluxos é sustentado por fundamentos sólidos ou estamos diante de mais uma leitura míope dos ciclos? A resposta ainda não é clara e os dados, talvez, controversos. Vamos aos pontos.

Investimento público: escala vs. execução
As recentes políticas fiscais nos Estados Unidos e na Europa mostram diferenças significativas tanto no volume dos estímulos quanto na forma como esses recursos são executados. Nos EUA, ainda no governo Biden, trilhões de dólares foram direcionados a iniciativas como o CHIPS Act, o Inflation Reduction Act e o Infrastructure Investment and Jobs Act, com uma abordagem que tinha como princípio a colaboração entre setor público e privado. Muito disso será revertido ou reescalado pelo governo atual, entretanto, a inércia desses recursos ainda deve provocar uma retroalimentação importante na economia. Na Europa, programas como o Recovery and Resilience Facility e o novo pacote de estímulo da Alemanha (estimado em €500 bilhões) também têm como foco setores estratégicos, mas certamente enfrentarão entraves institucionais que deverão afetar/atrasar sua implementação.
PMIs e atividade: reação ou renovação?
Os dados de atividade industrial sugerem que a Europa passa por uma recuperação limitada. O PMI industrial da região voltou a subir, mas ainda não sinaliza robustez. Nos Estados Unidos, apesar da desaceleração econômica em curso, o indicador ainda não gera questionamentos, apesar dos sinais de que a deterioração está se aproximando. É importante questionar se a melhora europeia é realmente sinal de retomada ou apenas uma pausa na estagnação.
Emprego: estabilidade real ou estatística amparada?
A taxa de desemprego na Europa atingiu níveis historicamente baixos (6,9%), mas esse desempenho tem sido sustentado, em grande parte, por mecanismos de apoio estatal. Nos EUA, apesar de uma leve desaceleração recente, o mercado de trabalho segue reagindo ao ciclo econômico com maior dinâmica e flexibilidade. A gig economy segue a pleno vapor, apesar dos últimos dados de alta frequência mostrarem alguma deterioração. A questão da qualidade dos empregos gerados é um ponto importante a ser considerado.
A situação do endividamento: Escala x Fragilidade
Embora os Estados Unidos tenham um endividamento elevado em relação ao PIB, esse passivo é financiado por um mercado de dívida extremamente líquido e, apesar do momento adverso, ainda é confiável. Na Europa, a situação fiscal é mais heterogênea: alguns países estão mais expostos à instabilidade política e financeira, especialmente por conta da ausência de uma política fiscal unificada. Por lá, o desejo dos investidores é comprar os bunds do tesouro alemão. Os títulos dos demais países da região são vistos com alguma descrença.
Regulação tecnológica: controle que inibe escala
Com legislações como o AI Act, a União Europeia tem procurado se posicionar na dianteira da regulação digital. Entretanto, o excesso de normatização provavelmente dificultará o crescimento/nascimento de empresas emergentes e a capacidade da região de competir globalmente em setores de alta tecnologia. A vantagem comparativa dos EUA neste segmento é clara: com uma regulação mais flexível e companhias dispostas a investir centenas de bilhões de dólares no setor, o país continuará liderando a inovação em IA, cloud computing e software. Vale ter em mente que os investimentos no setor serão transformadores para o mundo corporativo nos próximos anos.
Energia: oportunidade ou custo geopolítico?
A Europa ampliou significativamente suas importações de gás natural liquefeito (GNL), saltando de 75 para 115 bilhões de metros cúbicos entre 2022 e 2025. Essa estratégia ajudou a reduzir a dependência do gás russo, mas criou uma nova vulnerabilidade: a dependência das exportações americanas. O problema energético na região é claro, dado que a confiabilidade e produtividade das fontes de energia renovável ainda não são plenas. A utilização da energia nuclear ainda é um ponto de questionamento, dado o futuro descomissionamento das usinas francesas atuais e os conflitos para uma possível reativação das usinas na Alemanha.
Do lado dos EUA, esse também é um ponto de atenção, dada a falta de investimento nos últimos anos. A virada no discurso no setor veio com os investimentos na infraestrutura de IA, dada a necessidade clara da construção de novas usinas e fontes energéticas para se avançar com a implementação de novos data centers. O caminho aqui parece mais claro, dado o impulso prometido pelo governo e pelo claro direcionamento das companhias privadas.
Ucrânia: reconstrução e a emergência da polônia
Por fim, o fim da guerra na Ucrânia pode desencadear uma nova fase de crescimento na região leste da Europa. A Polônia, em particular, deve assumir protagonismo na reconstrução do país vizinho — algo já refletido nas ações do país: o EPOL (o ETF que adquire as ações de companhias do país, avança 41% no ano), o que pode aumentar sua relevância econômica e estratégica dentro da União Europeia. Essa frente, apesar de relativamente dependente da atuação de Donald Trump e da aceitação de Zelensky e Putin, abriria um espaço maior para a demanda por euro e pela continuidade da sua valorização recente.
Apesar dos avanços pontuais e dos argumentos favoráveis à Europa, seguimos enxergando o continente como um destino tático para investimentos, e não estrutural. A geração de valor global, a longo prazo, a nosso ver, permanece ancorada nos Estados Unidos. Precisamos ter em mente o pragmatismo incorporado nos alicerces da economia americana: normalmente os ajustes são sempre rápidos, vigorosos e tendem a colocar a sua força motriz corporativa em movimento. A capacidade de se reinventar das grandes corporações do país sempre esteve bem ancorada, independentemente dos desafios políticos. Seguiremos atentos à evolução dos fundamentos e sempre dispostos a reavaliar nossa visão diante de mudanças concretas.

Liberation Day e o novo equilíbrio comercial dos EUA No dia 2 de abril de 2025, ao anunciar o Liberation Day, o presidente Donald Trump provocou o impensável. A possibilidade de uma ruptura dos fluxos de capital em direção ao país ganhou vida, acarretada pelo anúncio de um amplo pacote tarifário que marcaria, segundo ele, uma nova era de independência econômica americana. Com base em uma lógica de “reciprocidade estratégica”, o plano previa uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações, além de alíquotas adicionais para países com superávit comercial relevante com os EUA — como China, Alemanha e Vietnã. A confusão provocada pelo anúncio trouxe reação imediata e negativa para os mercados: o índice Dow Jones caiu mais de 4.000 pontos em dois dias, o dólar desvalorizou frente às principais moedas globais e as treasuries foram pressionados por revisões nas expectativas de crescimento e inflação. Diante da deterioração dos ativos financeiros e do início de retaliações chinesas mais duras, a figura do Scott Bessent emergiu, com o propósito de contenção de danos. Com um perfil mais técnico e pragmático, rapidamente procurou iniciar uma operação “diplomática” para reconfigurar o rumo das medidas e deixar os propósitos mais claros aos investidores. Após a reconfiguração da estratégia de comunicação e a assunção de Bessent, Donald Trump anunciou uma pausa de 90 dias na aplicação plena das tarifas, com exceção das da China. E mais importante do que isso, abriu mais de 15 frentes de negociação bilateral com parceiros estratégicos, como Índia, Coreia do Sul e Japão. O objetivo, segundo ele, é “transformar o teto tarifário em um ponto de partida para acordos mais equilibrados”. Além disso, sugeriu que um “grande acordo” com a China ainda seria possível, contanto que Pequim recuasse em práticas consideradas desleais — como subsídios em semicondutores e restrições às empresas americanas. Ao mesmo tempo, ele buscou restaurar a confiança nos mercados, reafirmando o compromisso dos EUA com o comércio global e com um dólar forte e previsível. Resta saber, contudo, se a atuação de Scott Bessent será suficiente para conter os danos já impostos à credibilidade econômica dos Estados Unidos. Sua tentativa de reposicionar o país como interlocutor confiável, por meio de pragmatismo técnico e diplomacia bilateral, marca um contraste com a retórica agressiva da Casa Branca. Mas o mercado ainda parece dividido: estariam os investidores diante de um novo eixo de estabilidade institucional ou de mais um breve alívio em meio a uma tendência mais profunda de erosão da confiança no dólar — e, por extensão, na própria liderança americana? Não podemos esquecer do FED Em meio à reconfiguração comercial e às oscilações nos ativos globais provocadas pelo Liberation Day, o Federal Reserve, liderado por Jerome Powell, permanece como uma âncora institucional e moderadora das expectativas. Os recentes discursos ainda revelam uma autoridade monetária menos convicta de que a inflação está plenamente sob controle. A combinação dos núcleos ainda pressionados e da resiliência insistente da atividade impõe um compasso de espera desconfortável. Até aqui, Powell tem resistido à tentação de reagir aos ruídos políticos — as ameaças de Trump sempre foram uma constante enquanto presidente do Fed — e aos impulsos fiscais, mas o custo de manutenção de juros elevados sobre a dívida pública já começa a ser debatido com mais seriedade em Washington. Além disso, o alerta no sistema financeiro também está acionado: a economia americana será capaz a sobreviver à pressão dos chamados Bonds Vigilantes? O dilema está posto na mesa: preservar a credibilidade e aguardar a desinflação dar sinais mais claros ou dar suporte ao crescimento econômico? |
A hora e vez do Brasil: entre a simpatia externa e as contradições internas
Em meio à dispersão global dos fluxos de capital, o Brasil (finalmente) começou a se destacar como um destino alternativo, ainda que de forma parcial e tática. O valuation historicamente descontado e a melhora na percepção dos investidores institucionais, que parecem aceitar a antecipação da corrida eleitoral de 2026, são os fatores que mais explicam a recente valorização da bolsa local. A maior probabilidade de uma branda recessão global também alimenta o aumento das chances de estarmos próximos ao final do ciclo de alta da Selic, apesar dos discursos recentes mais duros, além de melhorar as chances para o início de sua redução ainda no final deste ano.
Ainda assim, há limites claros. O crescimento brasileiro segue inflado pelos gastos fiscais, o nível de investimento ainda é sufocado pela burocracia e não é capaz de aumentar a produtividade da economia. Seguimos dependentes do cenário externo e das oscilações dos preços das commodities. O processo de desinflação, embora comece a aparecer no horizonte, ainda é permeado por núcleos rígidos e serviços que a pressionam constantemente.
No campo político, a sensação de estabilidade é sustentada mais pela ausência de choques do que pela construção de consensos sólidos. Muito pouco do prometido tem realmente funcionado em prol do avanço econômico. A exceção parece estar no campo do programa Minha Casa Minha Vida, que conseguiu ampliar as perspectivas das companhias do setor. O aprofundamento das medidas de crédito, por sua vez, colocaram mais um ponto de atenção na capacidade da política monetária em controlar as expectativas dos preços.
Se por um lado esse caminho tortuoso deve dificultar os planos do setor privado, por outro, abriu espaço para a crença na antecipação da corrida eleitoral. É como se os investidores tivessem entrado no ambiente do velho dilema “quanto pior melhor”. Desde que a deterioração não se torne irreversível — o descontrole fiscal já parece estar na conta —, o impulso proveniente daí pode trazer bons frutos aos investimentos locais.
Nesse ambiente, a bolsa brasileira voltou a atrair investidores estrangeiros e a estrutura a termo da curva de juros finalmente veio para baixo dos 14% em praticamente todos os seus vértices. O fluxo de recursos aos fundos locais ainda não se reverteu totalmente, mas passou a dar sinais de estabilidade. É algo que pode ajudar a provocar uma corrida um pouco mais intensa para ativos de risco.

Fonte: Quantum axis e Empiricus Gestão
O comportamento dos mercados e as principais posições dos portfólios da Empiricus Gestão
Abril foi um mês de forte volatilidade nos mercados globais, marcado por uma espécie de desorientação tática. Nos Estados Unidos, as bolsas oscilaram ao sabor das incertezas provocadas pelo Liberation Day, o enfraquecimento da atividade econômica e a ausência de um guidance claro por parte do Federal Reserve. O índice S&P 500 encerrou o mês com perda de 0,87%, enquanto o Nasdaq sofreu com a fuga das magnificent seven, mas conseguiu emplacar bons pregões na reta final do mês e fechou o período com um leve ganho de 0,85%. No ano, as perdas acumuladas nestes índices estão em 5,10% e 9,65%, respectivamente.
Na Europa, o movimento foi mais comedido. O Euro Stoxx 50 subiu marginalmente, sustentado por expectativas de estímulo fiscal na Alemanha e pela revisão para cima dos PMIs industriais. Já nos mercados emergentes, o desempenho foi desigual: enquanto China e Sudeste Asiático sentiram os efeitos colaterais da nova rodada de tensão tarifária, Brasil e México se beneficiaram do fluxo marginal de realocação e da percepção de que seriam “refúgios relativos” em meio ao reposicionamento dos fluxos globais. Os principais índices desses países, o Ibovespa e o Mexbol avançaram 3,69% e 6,41%, respectivamente, e, no ano, atingiram as marcas de 12,29% e 12,72%.

Novamente, o ouro foi destaque positivo. A combinação entre a ameaça da desancoragem do dólar, a “aversão” global aos treasuries americanos e a busca por proteção contra os efeitos colaterais da nova política comercial provocou uma verdadeira corrida para o metal. O ouro atingiu máximas históricas, atingindo momentaneamente os US$ 3.500 a onça-libra. Desde o início do ano, o metal acumula alta superior a 25%, suportado pelo maior volume de aportes líquidos nos ETFs desde 2020.

Diante do cenário adverso, mantivemos uma postura mais defensiva em relação às alocações internacionais, procurando dar ênfase nos casos que deveriam ultrapassar as questões das tarifas comerciais sem grandes percalços. Vale ressaltar que o momento trouxe consigo a necessidade de recolocar a abordagem top down em primeiro plano. Os fundamentos das empresas, ainda bastante claros na maior parte dos casos, acabaram por ser deixados de lado. Em ambientes com níveis de tensão elevados, nos quais as incertezas dos rumos macroeconômicos crescem, tradicionalmente as correlações entre os ativos aumentam e a volatilidade claramente se torna a grande vilã. Navegar neste ambiente é difícil e requer uma boa dose de paciência.
Neste último mês, mantivemos essa abordagem em praticamente todos os fundos com posições internacionais. Nos fundos que possuem o mandato de tecnologia — o Empiricus Tech Select e o Empiricus Tech Bets — voltamos a comprar ações nos últimos pregões. No primeiro, montamos uma posição mais elevada nas ações do Netflix, diante de um quadro mais favorável de crescimento. A companhia tem conseguido emplacar aumentos de preços nos seus pacotes de assinatura e, paralelamente, trazer novos assinantes para os seus planos básicos que agora são alimentados por anúncios.

De forma bastante interessante, essa linha de negócio tem sido bem recebida pelos usuários, abrindo uma frente poderosa para a empresa. Além dela, aumentamos a exposição nas ações da Crowdstrike, Boston Scientific, Constellation Software e Mercado Livre.
No Empiricus Tech Bets, adotamos uma abordagem um pouco mais arriscada, conveniente ao propósito do fundo, e adicionamos as plataformas de e-commerce Shopify e Sea Limited (a primeira voltada para o comércio na América do Norte e a segunda no leste asiático); Doximity — plataforma voltada para o setor de saúde americano —, e o Uber, sob as premissas que deve se beneficiar com o avanço recente da Waymo e a futura adoção do veículos autônomos.

Nos demais mandatos internacionais, mantivemos posições elevadas nas ações da Berkshire Hathaway, empresa comandada por Warren Buffett, nas ações da seguradora The Progressive Corporation e Instacart.
Em nosso multimercado global, agora intitulado Empiricus Money Rider HF Global FIM, passamos o mês carregados nos ETFs de ouro e com o nível de caixa bastante elevado. Atualmente, o investimento em Bonds e títulos de renda fixa representam cerca de 75% do portfólio, e os demais recursos estão distribuídos entre os books de commodities — ouro (9%) e ETF de energia nuclear (1%) —; Macro — bitcoin 1,5% e um ETF de seguradoras (3%) —; e o restante no book de ações (Berkshire Hathaway, Netflix e Constellation Software. Dentre o book de Long & Short, o destaque veio do par comprado em ouro e vendido em Dollar Index. Apesar disso, o retorno do fundo no mês acabou decepcionando. Aqui, aguardamos um melhor momento para voltar a aumentar a exposição ao risco.
Já nos mandatos nacionais, os resultados de abril foram bastante satisfatórios. Nos fundos mais agressivos, como por exemplo o multimercado Empiricus Carteira Universa, o elevado posicionamento nas ações locais empurrou o retorno do fundo para cima. O mesmo aconteceu com os mandatos de renda variável, que superaram o Ibovespa no mês com alguma folga. No Empiricus Deep Value Brasil FIF Ações, aumentamos a exposição ao cíclico local, por meio do aumento da participação das ações da Rede D’or, Cury e Cyrela. Mas o destaque veio das ações do Mercado Livre, que avançaram mais de 16% no período.

Fonte: Empiricus Gestão
Por fim, vale mencionar o bom desempenho das estratégias de renda fixa. Em nossos fundo de liquidez, o Empiricus Cash Yield, alternativa de investimento para o nosso Empiricus Selic Simples, cuja limitação de aporte por cotista é de R$ 100 mil, superou o benchmark e, neste ano, temos mantido um retorno na casa dos 102,8%.
Em termos gerais, iniciaremos o mês de maio cautelosos, mas um pouco mais construtivos. O nível de incerteza continua elevado, mas os preços dos ativos parecem ter atingido um patamar atrativo. Seguimos atentos às oportunidades e as mudanças de comportamento dos investidores diante das mudanças bruscas do quadro macroeconômico.
Considerações finais
Abril foi um mês ambíguo: mais um daqueles em que o ruído parece querer tomar o lugar do fundamento. O mercado oscilou entre a perplexidade provocada pelo Liberation Day, o alívio passageiro dos dados de inflação e a busca por proteção diante de uma ordem global cada vez mais tensionada. Ao longo da carta, procuramos dar forma a esse retrato: um cenário que não é unidirecional, mas multifacetado — e que exige, mais do que previsões, discernimento.
No prólogo, lembramos do cometa de Não Olhe para Cima — não por ceticismo, mas por consciência do quão fácil é, mesmo entre os mais atentos, perder o fio condutor diante do ruído coletivo. A diferença entre a negação e o pragmatismo está, muitas vezes, em saber olhar para cima quando todos parecem confortáveis com o chão. É assim que encaramos o momento atual: sem pânico, mas com os olhos abertos para os riscos que estão à margem das narrativas dominantes.
Daqui a alguns dias, Warren Buffett subirá ao palco em Omaha e, provavelmente, repetirá o mantra de sempre: Don’t bet against America. E talvez ele esteja certo. Mas mesmo essa convicção precisa hoje ser contextualizada: não por descrença, mas pela percepção de que os Estados Unidos, como os mercados, também enfrentam seus dilemas internos — institucionais, fiscais e geopolíticos. A frase permanece válida, mas o que está em jogo é qual América ainda merece essa aposta.
Em nossos portfólios, traduzimos esse raciocínio em decisões táticas bem marcadas: mantivemos proteções relevantes, ampliamos a exposição ao ouro, reforçamos a seletividade em tecnologia e, no Brasil, atuamos com prudência diante do que julgamos ser um rali momentaneamente mais técnico do que estrutural — precisamos de mudanças macroeconômicas claras para que ele se consolide.
A disciplina da gestão está em não confundir o reflexo com a causa — e lembrar sempre de uma verdade elementar: o capital não aguenta desaforo. Ele escapa, silenciosamente, de onde não se sente respeitado — e se aloja onde encontra coerência, horizonte e estabilidade.
Seguimos atentos, convictos de que as oportunidades — as reais — continuarão surgindo para quem resistir à pressa, ao consenso fácil e ao conforto das certezas frágeis. E como sempre, prontos para recalibrar a rota quando a paisagem mudar.
Forte abraço,
João Piccioni

Disclaimer
Os fundos de investimento não contam com garantia do administrador do fundo, do gestor da carteira, de qualquer mecanismo de seguro ou, ainda, do fundo garantidor de créditos – FGC. A rentabilidade obtida no passado não representa garantia de rentabilidade futura. É recomendada a leitura cuidadosa do prospecto e regulamento do fundo de investimento pelo investidor ao aplicar seus recursos. Para avaliação da performance do fundo de investimento é recomendável uma análise de, no mínimo, 12 (doze) meses. Este fundo utiliza estratégias com derivativos como parte integrante de sua política de investimento. Tais estratégias, da forma como são adotadas, podem resultar em significativas perdas patrimoniais para seus cotistas. Os fundos multimercados com renda variável podem estar expostos a significativa concentração em ativos de poucos emissores, com os riscos daí decorrentes.
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