Diário de Bordo
Ganhos de margens operacionais e Juros Baixos: a Receita para a alta dos mercados
A Black Friday acontecida na semana passada trouxe aos analistas de plantão mais um enigma para se avaliar as reais condições das economias globais. Se no Brasil, os trackings se mostraram mistos em relação às vendas no período; lá fora, os dados da Salesforce mostraram que o consumidor médio continua afeito por uma promoção – desde que ela seja feita por meio do e-commerce.
Por aqui, o salto no GMV do Mercado Livre(*) na data surpreendeu (de acordo com os dados da companhia, o volume aumentou 80% na comparação anual) e evidenciou suas vantagens comparativas frente à concorrência, dada a fraqueza dos números relativos ao evento. De acordo com a Cielo, as vendas deste ano cresceram somente 2,1% em relação ao ano passado em termos nominais. A consultoria Confi.Neotrust, por sua vez, declarou que a retração no volume de vendas do período em relação à 2022 foi de 15%. O ambiente online, entretanto, teria se destacado de acordo com as consultorias.
O ambiente competitivo tornou-se o grande direcionador de valor no setor. Com o desastre que se tornou o caso Americanas, as empresas do setor foram mais comedidas no investimento em promoções e procuraram manter estratégias mais rentáveis. A declaração de Eduardo Glanternick, VP da Magazine Luiza, foi nessa direção: a expectativa baixa em relação à demanda teria levado a varejista a utilizar estratégias de combate voltadas para o ganho de margens. Já outros setores específicos, como o calçadista, por exemplo, surpreenderam. Foram um pouco mais agressivos e procuraram aproveitar a data para desovar seus estoques, ainda elevados. Como os números das companhias serão divulgados somente em março, até lá, as avaliações do mercado sobre as estratégias adotadas serão as mais dispersas possíveis e os olhos vão se voltar para o Natal.
Nos EUA, de acordo com as gigantes Adobe Analytics e Salesforce, houve crescimento das vendas. O brilho não foi intenso, mas mostrou que o consumidor ainda possui interesse em aproveitar as temporadas de compras. O e-commerce novamente foi o destaque, e a estimativa da Mastercard apontou para um crescimento de 8,5% do segmento. Aqui a leitura sobre o nível de promoção é mais difícil, dado o vasto número de competidores. Minha aposta é que a Amazon(*) voltou a se destacar, depois do excelente resultado obtido no Prime Day. Não ficarei surpreso se ela trouxer novamente recordes nas linhas de GMV e de Advertising nos resultados do 4T23.
De forma geral, o processo de desinflação vai ficando mais claro com os números provenientes do varejo. O crescimento das vendas sob a ótica da moeda nominal vem desacelerando, devido ao enfraquecimento do consumidor e maior dificuldade de repasse de preços. Se, por um lado, esse efeito atinge a primeira linha do DRE das companhias, por outro, abre um pouco mais de espaço para o controle de despesas e recuperação das margens operacionais. Somado a um processo de afrouxamento monetário (primeiro aqui no Brasil e depois nos países desenvolvidos), tal dinâmica deveria impulsionar o valor intrínseco das companhias. Explico.
No primeiro momento, logo no início da pandemia, a política fiscal cumpriu um papel relevante na estabilização das economias globais, por meio da ampla injeção de recursos nas mãos das famílias. Isso fez com que o preço das matérias primas avançasse, levando os preços dos produtos industrializados para cima. A inflação afetou os custos operacionais (salários e logística) e provocou a reação dos Bancos Centrais, que elevaram os juros para contê-la. Os efeitos no ambiente corporativo alcançaram a estrutura de capital, levando o custo do serviço da dívida a níveis bem elevados.
O retorno negativo visto nas ações no final de 2021 e durante o ano de 2022 foi reflexo das expectativas de deterioração dos balanços, provocadas pela forte elevação dos juros e pelos efeitos inflacionários nas economias. Não foi à toa que praticamente todas as bolsas globais caíram neste período.
Já em 2023, as expectativas se tornaram mistas. Alguns setores da economia conseguiram evitar o efeito do ciclo econômico com mais facilidade, viram suas ações decolarem e tocarem novas máximas (o caso das empresas de tecnologia, turismo e algumas commodities). Outras, começaram a dar sinais de melhora somente no terceiro trimestre, devido especialmente aos efeitos do processo desinflacionário em curso. Em média, as empresas apresentaram redução no passo do crescimento das receitas, mas mostraram avanço na lucratividade. Em 2024, esse processo ficará ainda mais claro, dada a recuperação das margens e o alívio nas taxas de juros.
Esses efeitos serão ainda mais percebidos nas companhias brasileiras. Isso porque a redução da taxa básica de juros no país afeta mais intensamente a dinâmica operacional das empresas locais. Além dos custos financeiros associados à estrutura de capital (o dinheiro mais barato permite uma alavancagem financeira maior), em paralelo, há efeitos de segunda ordem no financiamento de capital de giro das companhias (o financiamento de toda cadeia produtiva fica mais barata). Com isso, a geração de fluxos de caixa será maior, devido ao engessamento dos preços dos produtos em níveis elevados, devido à menor pressão das despesas operacionais e, se tudo der certo, por conta do vento de cauda proveniente de uma economia sem o torniquete dos juros altos.
Dado este conjunto de variáveis, espero que o valor intrínseco das companhias avance substancialmente ao longo de 2024. Os investidores não ficarão parados e, certamente, colocarão seus recursos para trabalhar. A não ser que haja alguma ruptura importante do tecido econômico, os valuations das companhias começaram a ficar bem mais atrativos. Devagar e, então, de repente. Fique atento!
(*) No momento, as ações da Amazon (AMZN) e do Mercado Livre (MELI) representam as maiores posições do Empiricus Tech Select FIA e do Empiricus MoneyRider Ações Dinâmico FIA, respectivamente.
O comportamento dos mercados no mês de novembro
Até agora, não há o que reclamar do mês de novembro. Os ativos de risco destravaram e avançaram substancialmente. Até aqui, destaque para o Ibovespa que sobe mais de 12%, aos 126.500 pontos. A renda fixa também deslanchou com a queda da curva de juros. O DI com vencimento em janeiro de 2026 caiu 89 pontos base, puxado pela retração das expectativas de inflação e pela possibilidade de aceleração do processo de queda dos juros brasileiros nas reuniões do ano que vem. Neste mesmo embalo, até hoje cedo, o real subia cerca de 2,8% no mês frente ao dólar.
Lá fora, o bom humor dos investidores se manteve em alta. O VIX (índice do medo) voltou a oscilar na casa dos 12 pontos, sinalizando o maior apetite pelo risco. O índice S&P 500 se segurou na casa dos 4.500 pontos e sobe 8,5% no mês em dólares. Os treasuries voltaram a se apreciar e agora o título de dez anos é negociado por 4,36%. A queda das taxas de juros também empurraram o ouro para cima. No fechamento de ontem, o metal precioso alcançou a marca dos US$ 2.040 a onça-libra.
Nessa reta final de mês, as dúvidas dos investidores em relação à dinâmica econômica se reduziram. Os dados divulgados durante os últimos dias ratificaram a ideia de um ambiente economicamente mais fraco, mas incapaz de descarrilar por completo a economia americana.
Os mais pessimistas ainda enxergam a possibilidade de uma recessão mais forte, enquanto outros já olham para o copo meio cheio. Para o Goldman Sachs, por exemplo, a probabilidade de recessão nos EUA são baixas (15%), dados os efeitos positivos que devem advir do processo desinflacionário e de um eventual alívio monetário. Isso levaria a bolsa americana buscar novas novas máximas. Gosto desta proposição e, dados os resultados e comentários das Big Techs, vejo-a como bastante factível. Do mesmo jeito que talvez a recessão econômica já tenha chegado — saberemos somente daqui a 12 meses —, muito provavelmente as mínimas dos mercados já tenham ficado para trás. À conferir.
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